domingo, 23 de outubro de 2011

Um Jeca em Atibaia completa quinze anos


Continuando a garimpagem no Garatuja achei e ressuscitei  o curta metragem Um Jeca em Atibaia, de 1996. Cabem aqui algumas considerações. Até a data de sua realização não havia a facilidade dos atuais meios digitais de captação, e principalmente, de tratamento de imagens. Dava um trabalho danado fazer filme. O que havia era o vídeo VHS que exigia equipamentos sofisticados, conhecimentos técnicos e elevado custo financeiro, ficando restrito a poucos. O Super-8 ainda se mostrava uma opção viável e vivia um período de renascimento e expansão. O Jeca foi realizado nessa bitola. Foi o primeiro filme resultado de oficina feito em Atibaia, aliás, oficina de cinema  era  novidade até para muitas cidades grandes na época. Anos antes, Collor e sua desastrosa política cultural havia acabado com o cinema nacional e qualquer tentativa de revitalização na área era bem vinda, daí a grande repercussão que a oficina alcançou. A iniciativa de trazer essa oficina pra Atibaia foi minha. Desde jovem me interessava pelo Super 8 (lembro-me da minha empolgação ao assistir  filmes que passavam no programa Ação Super 8, da TV Cultura) e foi somente em 1983 que consegui a primeira filmadora. O Garatuja estava começando suas atividades e pretendia aprender a usá-la para fazer animações com as crianças. A idéia só se concretizaria treze anos depois...mas voltando ao Jeca: Em 1996 a Élsie era Coordenadora de Cultura e através da Prefeitura foi realizado o projeto História do Cinema Brasileiro, iniciativa da Secretaria de Estado da Cultura de SP. No evento, além da oficina, aconteceram exposições de fotos e cartazes, exibições de filmes e vídeos, cinema comentado, lançamentos, palestras e bate-papo com Tizuka Yamazaki, César Memolo Jr, Carlos Reichenbach e André Carneiro. André Carneiro esteve presente por ocasião da telecinagem dos filmes Solidão, A Briga e outros realizados na década de cinqüenta, e que  estavam a anos depositados no Museu Municipal em formato 16 mm. Nesse evento aconteceram as primeiras homenagens àqueles que tiveram influência no cinema em Atibaia, também por sugestão minha: Cesar Mêmolo, Andrë Carneiro, Tizuca Yamazaki, Lázaro Chiocchetti, Juvenal Alvim e Euclides Sandoval. As homenagens antecederam a peça Dona Doida interpretada por Fernanda Montenegro. Voltando ao assunto da Oficina de Cinema, para viabilizá-la dentro da programação da Prefeitura, foi necessário encontrar profissionais dispostos a enfrentar uma maratona burocrática. Através de anúncio no jornal , sobre um curso de cinema Super 8 que aconteceria em São Paulo, cheguei ao Marcos Fontana e Sérgio Concílio, fotógrafo e diretor respectivamente, e mais tarde conheci a Elza Corsi. Foram eles, através da produtora Cinema 8-16-35 que realizaram as oficinas em Atibaia. Quase cinqüenta pessoas foram selecionadas, entre as mais de duzentas inscrições. Os participantes foram divididos em diferentes áreas: atores, produtores, fotógrafos, iluminadores, etc. O roteiro surgiu quase naturalmente, pois havia a presença de João Carlos dos Reis, que era a cara do Mazzaropi. Foi um momento único, de muita efervescência cultural na cidade. Nesse clima cogitou-se a criação de um Núcleo de Cinema voltado as pequenas bitolas, muito por sugestão de pessoas que já militavam na área, e que aqui estavam, vindos de Campinas, São Paulo e Rio Grande do Sul.

O impulso maior veio de Carlos Reichenback, que apoiou a idéia e ressaltou a importância de se atuar de forma independente e com propostas novas: assim nasceu o NUCA - Núcleo de Cinema de Atibaia. De vida curta, mas bastante profícua, o NUCA chegou a realizar várias mostras de filmes Super 8 na cidade,  numa delas exibindo somente filmes selecionados no Festival de Gramado. O Festival de Gramado foi por muito tempo a maior vitrina do cinema Super-8 no país. As mostras de Atibaia passaram a acontecer também em Campinas. Até pouco tempo acontecia a Mostra de Cinema Super-8 de Campinas (tenho conhecimento até a 10 edição). A publicação de CINEMAGIA, um jornalzinho sobre cinema independente, também foi trabalho do NUCA. Fizemos ainda o vídeo Todos os Fogos, cuja única cópia se perdeu. É bom lembrar que no mesmo período aconteceu outro fato importante relacionado ao cinema local. Foi a intervenção da Prefeitura, através da insistência do Diretor de Cultura na época, Gilvan Elias Pereira, para manter a única sala de exibição da cidade, que por pouco não se transformou em mais um local de comércio comum. Lembro-me que depois de várias tentativas: da concessão a cineclubes, ao aluguel para empresas cinematográficas comerciais, a Prefeitura optou pela responsabilidade de dividir o aluguel do imóvel com a Empresa São Luis, através de licitação, que assumia assim o compromisso das exibições. Dessa forma o cinema foi reformado e o pequeno palquinho existente foi ampliado. Com isso a cidade ganhou também um espaço cênico, aproveitando o excelente projeto acústico já existente do Cine Atibaia, que passou a chamar Cine-teatro Atibaia. Nessa época Atibaia não dispunha de nenhum espaço para apresentações de teatro e dança. A qualidade dos filmes exibidos e da projeção era uma exigência de contrato, destacando a obrigatoriedade de exibição de filmes nacionais. O Departamento de Cultura tinha acesso ao espaço uma semana a cada mês, para eventos e programações por ela realizada. É bom lembrar que nesse periodo eram quase inexistentes o repasse de verba da cultura para os municípios, rarissimos os projetos encaminhados pela Secretaria de Estado ou Ministério da Cultura, e o que se contava eram com parcos recursos municipais disputados palmo a palmo com outras Secretarias. Hoje o Cine Atibaia ainda é o único espaço exibidor da cidade. Anos mais tarde esse acordo foi bastante criticado pela oficialidade local, que infelizmente não demonstrou sabedoria suficiente para fazer uma análise dentro do contexto histórico, e preferiu a superficialidade da crítica rasa, buscando somente desqualificar gestões passadas, visando interesses eleitorais (e pessoais). E já que estou pondo alguns pingos nos ís, vale a pena ressaltar que embora não conste em nenhum crédito, o Garatuja teve papel fundamental na realização dessa oficina e conseqüentemente do curta. Muito da infra-estrutura empregada em sua realização foi dada pelo Garatuja: do espaço físico ao telefone. Sem cobrar nada por isso. O Garatuja poderia perfeitamente receber, pelo menos, os créditos como realizador no filme. Abaixo o vídeo.
Márcio Zago


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